segunda-feira, abril 25, 2005

... porque hoje é feriado!


Portugal
Portugal, se fosses só três sílabas,
linda vista para o mar, Minho verde, Algarve de cal,
jerico rapando o espinhaço da terra,
surdo e miudinho,
moinho a braços com um vento
testarudo, mas embolado e, afinal amigo,
se fosses só o sal, o sol, o sul,
o ladino pardal,
o manso boi coloquial,
a rechinante sardinha
a desancada varina,
o plumitivo ladrilhado de lindos adjectivos,
a muda queixa amendoada
duns olhos pestanítidos
se fosses só a cegarrega do estio, dos estilos,
o ferrugento cão asmático das praias,
o grilo engaiolado, a grila no lábio,
o calendário na parede, o emblema na lapela,
ó Portugal, se fosses só três sílabas
de plástico, que era mais barato!
Doceiras de Amarante, barristas de Barcelos,
rendeiras de Viana, toureiros da Golegã,
não há « papo-de-anjo » que seja o meu derriço,
galo que cante a cores na minha prateleira,
alvura arrendada para o meu devaneio,
bandarilha que possa enfeitar-me o cachaço.
Portugal: questão que eu tenho comigo mesmo,
golpe até ao osso, fome sem entretém,
perdigueiro marrado e sem narizes, sem perdizes,
rocim engraxado,
feira cabisbaixa,
meu remorso,
meu remorso, de todos nós…
Alexandre O'Neill (1965)
Deixo-vos neste dia com um poema crítico sobre Portugal do Poeta Alexandre O’Neill.
Escolhi falar dele em vez de falar de factos históricos sobre a Revolução dos Cravos.
O’Neill porque foi uma das pessoas, a qual a ditadura salazarista não permitiu viver um amor feliz. Ele apaixona-se pela surrealista francesa Nora Mitrani e os pais, tendo boas ligações com a PIDE, impediram-no de “dar o salto”. Casou-se entretanto com Noémia Delgado, mas eu acho que ele nunca esqueceu a Nora (que se suicida em 1957). Enfim… nesses tempos se calhar ainda se morria por amores.
Espero que gostem do poema e que ele vos incentiva a pensar no nosso Portugal!


Sem comentários: